Por

Tiago da Silva Alexandre 

Fisioterapeuta; Especialista em Gerontologia; Mestre em Reabilitação; Doutor em Saúde Pública pela Universidade de São Paulo, Pós-Doutor em Epidemiologia e Saúde Pública pela University College London; Professor Adjunto do Departamento de Gerontologia da Universidade Federal de São Carlos; Atual presidente do Departamento de Gerontologia da SBGG-SP.

Roberta de Oliveira Máximo

Fisioterapeuta; Especialista em Fisioterapia em Neurologia; Mestre em Fisioterapia pela Universidade Federal de São Carlos – UFSCar; doutoranda em Fisioterapia – UFSCar (atual).

 
 
O declínio de massa muscular esquelética com o avanço da idade foi reconhecido e nomeado por Irwin Rosenberg em 1989 pelo termo sarcopenia, que do Grego significa ‘sarx’ ou carne + ‘penia’ ou perda.
À época, já havia um elementar entendimento de que a menor massa muscular em idosos era acompanhada por um aumento da massa de gordura e estava relacionada a mudanças na função física.
Inicialmente, diversos autores forneceram uma definição de trabalho através de índices baseados em estimativas de massa muscular, no intuito de determinar a prevalência de sarcopenia em idosos. No entanto, todas essas definições mensuravam a massa muscular de forma isolada, sem a atribuição de uma medida da função muscular.
Desde lá, a conceituação de sarcopenia tem sido aprimorada e ganhou em 2010 uma definição clínica prática e critérios diagnósticos consensuais realizado pelo European Working Group on Sarcopenia in Older People (EWGSOP).
Nesse trabalho, os autores propuseram um algoritmo e recomendaram o diagnóstico de sarcopenia quando na presença de baixa massa muscular e baixa função muscular (força ou desempenho físico).
Diversos estudos foram realizados desde então e houve um crescente reconhecimento dos desfechos adversos da sarcopenia em termos de incapacidade, morbidade e mortalidade. No entanto, a mais recente evidência aponta que o declínio de força muscular sobrepuja o de massa muscular e que o desempenho físico parece mais como uma medida de desfecho de sarcopenia.
Assim, para refletir a evidência acumulada ao longo dos últimos anos, um novo esforço foi concentrado para atualizar a definição e o algoritmo de sarcopenia. Como resultado, em 2018 o mesmo grupo europeu lançou o EWGSOP2.
A atualização do algoritmo pelo EWGSOP2 incorpora um raciocínio nomeado por eles como FACS, sigla formada pelas iniciais de Find – Assess – Confirm – Severity (que em português significa Encontrar, Avaliar, Confirmar e Estabelecer a Gravidade), e cujo objetivo é facilitar o uso do algoritmo em contextos clínicos (Figura 1 e 2).
O primeiro passo da avaliação se pauta no uso do Questionário SARC-F para encontrar pessoas com maior probabilidade de apresentar sarcopenia. Em seguida, a força muscular ganha destaque na avaliação e é utilizada para identificar uma provável sarcopenia, com o diagnóstico sendo confirmado pela presença de baixa quantidade ou qualidade muscular. O desempenho físico, antes central na definição de sarcopenia, agora é usado para categorizar a gravidade da condição.
Assim como no Consenso anterior, é mantida a sugestão de ferramentas e instrumentos para se mensurar os parâmetros de sarcopenia, mas mudanças significativas são vistas nesse ponto. A mensuração da força muscular pela força de preensão manual continua como predileta, mas o teste de levantar da cadeira aparece como alternativa no lugar da flexão/extensão de joelhos. A quantificação da massa muscular (massa total de tecido magro do corpo ou massa muscular esquelética apendicular, ajustada para o tamanho do corpo) ainda tem sua avaliação preconizada por métodos como ressonância magnética (RM), tomografia computadorizada (TC), absorciometria de dupla energia por raios X (DXA) ou análise de impedância bioelétrica (BIA), sendo o uso da circunferência da panturrilha elevado a um importante proxy de diagnóstico quando nenhum outro método for acessível. Com relação ao desempenho físico, permanecem os testes de velocidade de caminhada, Short Physical Performance Battery (SPPB) e o Timed Up and Go Test (TUG), sendo acrescida a caminhada de 400 metros.
Ademais, uma nova mudança se fez pela indicação de pontos de cortes para cada condição, no intuito de aumentar a harmonização dos estudos de sarcopenia. A revisão do Consenso sugere alguns pontos de cortes baseados na população europeia, deixando recomendado o uso de populações normativas regionais para medidas dependentes de estatura, como a força muscular e velocidade de caminhada.
O EWGSOP2 adota as notas para diminuição da força de preensão manual <27 kg para homens ou <16 kg para mulheres; prejuízos no teste de sentar e levantar da cadeira quando o desempenho for >15 segundos para cinco subidas; redução da massa muscular quando a massa muscular esquelética apendicular (MMEA) for < 20 kg para homens ou < 15 kg para mulheres ou o índice de massa muscular esquelética apendicular (IMMEA) for < 7 kg/m2 para homens ou < 6 kg/m2 para mulheres; redução da velocidade de caminhada quando o desempenho for ≤ 8m/s; TUG ≥ 20s ou o desempenho na caminhada de 400 metros for ≥ 6 min.
Um ponto comum entre o Consenso de 2010 e o de 2018 é a definição de sarcopenia primária e secundária. Em ambos, a sarcopenia “primária” (ou relacionada à idade) é caracterizada por nenhuma outra causa específica evidente, enquanto na sarcopenia “secundária” outros fatores além do envelhecimento são evidentes, seja por questões de estilo de vida ou até mesmo secundária a uma doença sistêmica. Um ponto recentemente adicionado são as subcategorias de sarcopenia, denominadas como aguda e crônica, sendo que o tempo de seis meses distingue as condições.
Assim como anteriormente, os autores reportam a obesidade sarcopênica como uma condição distinta fora do escopo do presente Consenso e a fragilidade é tida como uma entidade que tem características que se sobrepõe à sarcopenia, incluindo a baixa força de preensão e baixa velocidade de caminhada. Aqui a sarcopenia é reconhecida como uma doença e não uma síndrome.
Novamente, outras diferenças se fazem entre o primeiro e o novo Consenso: o atual lista as tendências e os métodos mais promissores para determinar quantidade e qualidade muscular para auxiliar na detecção da sarcopenia, mas deixa de fora a questão da terapêutica da sarcopenia.
Sabe-se que as intervenções para prevenir a sarcopenia devem começar muito cedo e algumas medidas são mais eficazes que outras para reversão da condição.
A instituição de um treinamento progressivo de exercícios resistidos em idosos promove significativa melhora na força muscular e desempenho físico, como a velocidade da caminhada e habilidade para subir escadas, e deve ser estabelecido pelo menos de 2 a 3 vezes na semana.
Outra prática que deve ser assegurada é a ingestão de proteína e a suplementação de aminoácidos essenciais, sendo indicado para prevenir e tratar a sarcopenia a ingesta de uma quantidade de proteínas que supere a quantidade recomendada para adultos jovens (0,8 g/kg/dia), idealmente entre 1,2 e 1,5 g/kg de peso por dia, distribuídas igualitariamente entre as principais refeições.
A reposição de vitamina D em idosos com baixos níveis séricos, definido em geral por valores abaixo de 30 ng/mℓ de 25(OH) vitamina D, tem mostrado efeito na melhora da força muscular e desempenho físico e pode ser estimulada em idosos sarcopênicos.
Embora seu envolvimento na etiopatogenia da sarcopenia seja inconteste, terapias como insulina, estrógeno, testosterona, deidroepiandrosterona (DHEA), hormônio do crescimento (GH), fator de crescimento semelhante à insulina e paratormônio (PTH) têm papéis controversos em relação à perda de massa muscular no idoso ou evidências insuficientes para recomendação.
Os autores pretendem com as diretrizes atualizadas do EWGSOP2 aumentar a conscientização sobre a sarcopenia, garantindo que profissionais de saúde promovam a detecção e o tratamento precoces de pessoas sobre risco. Espera-se também que o novo Consenso incentive mais pesquisas no campo da sarcopenia, a fim de prevenir ou retardar os resultados adversos que também representam um grande ônus para os pacientes e para o sistema de saúde.
 
 
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Referências bibliográficas:

  1. Rosenberg, I. H. (1997). Sarcopenia: Origins and Clinical Relevance. The Journal of Nutrition, 127(5), 990S–991S. https://doi.org/10.1093/jn/127.5.990S
  2. Choi, K. M. (2013). Review Article Sarcopenia and Sarcopenic Obesity, 86–89. https://doi.org/10.3904/kjim.2016.193
  3. Cruz-Jentoft, A. J., Baeyens, J. P. et al (2010). Sarcopenia: European consensus on definition and diagnosis. Age and Ageing, 39(4), 412–423. https://doi.org/10.1093/ageing/afq034
  4. Cruz-Jentoft, A. J., Bahat, G. et al (2018). Sarcopenia: revised European consensus on definition and diagnosis. Age and Ageing, 39(4), 412–423. https://doi.org/10.1093/ageing/afy169
  5. Freitas, Elizabete Viana De; Py, Ligia. Tratado de Geriatria e Gerontologia. 4ª Ed. Guanabara Koogan, 2016.

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