Muito se fala sobre a importância de se cuidar da saúde do idoso e isso inclui cuidar também da saúde bucal. Uma boca saudável geralmente reflete um corpo saudável.
Segundo um estudo de 2005, até a década de 1960 a boa saúde bucal se baseava muitas vezes na extração dos dentes do indivíduo. Depois disso, a odontologia evoluiu para tratamentos curativos e, finalmente, para medidas preventivas. Hoje o conceito de saúde bucal não se refere apenas a dentes preservados mas principalmente a qualidade de vida.
Uma boca mal cuidada pode trazer inúmeras consequências para a saúde do indivíduo. A ausência de dentes, por exemplo, pode levar a insuficiência mastigatória, disfagia moderada, desordens de articulação e fala, entre outros. Já a gengivite pode evoluir para uma periodontite, que em casos graves pode aumentar as chances de infarto, AVC e doenças pulmonares.
A questão psicológica também é afetada pela saúde bucal, já que a ausência de dentes tem um forte impacto na autoestima e, consequentemente, na qualidade de vida do indivíduo.
Por causa disso, é imprescindível estar atento à saúde bucal do idoso. Pequenos ajustes podem ter um grande impacto. Para casos mais extremos, recursos como próteses podem não apenas melhorar a nutrição e a fala, mas também na melhora da autoimagem e socialização.
Confira a entrevista em que Mirtes Helena Dias, especialista em odontogeriatria pelo Conselho Federal de Odontologia e cirurgiã-dentista do Hospital do Servidor Público Municipal, em São Paulo, aborda as patologias orais mais comuns nos idosos, importância do tratamento e recomendações de cuidado.
Quais as recomendações para a higiene bucal do idoso?
A higiene bucal do idoso não difere dos outros grupos etários em sua essência, porém, alguns instrumentos mais específicos podem ser recomendados. Quando se trata desse contingente populacional, é importante lembrar que parte deles pode apresentar alguma limitação física, necessitando de uma maior motivação para realizá-la, para que possa haver um resultado mais satisfatório.
A higiene bucal deverá começar pela limpeza dos dentes, e deve ser feita sempre após as refeições, utilizando uma técnica correta orientada pelo cirurgião-dentista. Utiliza-se escova dental (Fig.1a) com cabeça pequena para alcançar todas as áreas da boca, com cerdas macias para não causar retração da gengiva. Para locais onde o espaço entre os dentes (interdentário) é maior, associa-se a escova interdental (Fig.1b). Para aqueles idosos que apresentam maior dificuldade para fazer a escovação, a escova elétrica (Fig.1c) é bem indicada. Já os dentifrícios são auxiliadores na escovação e possuem substâncias levemente abrasivas e detergentes. Preferencialmente devem conter flúor. As pastas medicamentosas só devem ser utilizadas com indicação do cirurgião-dentista, pois possuem ação terapêutica.
O fio dental (Fig.2), por sua vez, é indicado para remover restos de alimentos e também o biofilme dos lugares onde a escova não alcança: os espaços interdentais. Esses espaços variam de um paciente para outro, por isso, existem três tipos básicos de fio: extrafino, para dentes muito próximos; convencional, para espaços normais; e fita dental, para dentes mais distantes. Para idosos que apresentam algum comprometimento cognitivo, o segurador de fio dental (Fig. 2) é de grande valia.
A limpeza da língua também faz parte da higiene bucal, pois ela pode conter restos de alimentos ou saburra lingual (composta por bactérias, restos de alimentos e células epiteliais descamadas), cujo aspecto é uma camada esbranquiçada ou levemente amarelada no dorso da língua. Pode-se utilizar a escova dental ou limpador lingual (Fig.3).
É certo que a escovação e o uso do fio dental têm sido os melhores métodos para prevenir e controlar o biofilme, porém, os antissépticos bucais poderão ser usados como meios auxiliadores na higiene bucal. Alguns têm flúor em sua fórmula ou mesmo estar associado a um anti-inflamatório. Preferencialmente deverão ser utilizados com indicação do cirurgião-dentista.
Em que caso é indicado o uso de aparelhos protéticos em idosos?
Os aparelhos protéticos são indicados sempre que houver necessidade de reposição dentária e a eleição do aparelho dependerá da necessidade de cada paciente. Eles serão contraindicados em casos em que o idoso não consiga utilizá-lo, como em alguns tipos de câncer bucal, no estágio avançado da doença de Alzheimer, ou simplesmente pelo fato do paciente não se adaptar com eles.
Quais os cuidados necessários com as próteses?
Quando o idoso tiver uma prótese fixa (unitária ou não), os cuidados de higiene são os mesmos necessários dos pacientes que tem dentes naturais, descritos acima.
Os aparelhos protéticos – sendo a prótese total conhecida como dentadura e prótese parcial removível conhecida como ponte) também devem ser higienizados, porém fora da boca e em local livre de queda. Poderão ser escovados com escova dental comum ou então com uma específica para prótese (Fig.4), utilizando dentifrício de baixa abrasividade. É interessante que fiquem imersos em líquidos bactericidas por um determinado tempo, de acordo com a orientação do cirurgião-dentista. No caso específico da dentadura, é conveniente que seja retirada da boca durante a noite para haver descanso das glândulas salivares do palato e, colocada em um copo d’água para não desidratar o acrílico. A avaliação anual das próteses pelo profissional é necessária para acompanhamento da adaptação das mesmas.
Um dos principais problemas bucais do idoso é a diminuição da saliva. O que isso acarreta?
A diminuição da quantidade de saliva no idoso pode trazer consequências em sua saúde bucal, em maior ou menor grau, dependendo da intensidade dessa redução. A saliva tem propriedades de extrema importância, como remineralização dos dentes, lubrificação e proteção dos tecidos bucais, presença de enzimas, efeito tampão – aumento do pH (potencial Hidrogênico) – neutralizando a saliva, além de contar com anticorpos que controlam a proliferação de fungos e bactérias. Com sua diminuição, todos esses benefícios ficam prejudicados. Por consequência, a digestão e a deglutição dos alimentos estarão dificultadas, bem como a proteção dos dentes, tornando-os mais suscetíveis a cáries e doenças periodontais, como gengivite e periodontite.
Os usuários de prótese total também não estão livres das perdas, pois a dentadura necessita da saliva para sua fixação. Uma alternativa para aliviar esses incômodos é o uso de salivas artificiais – elas não devolvem todas as propriedades da saliva, mas proporcionam um conforto importante ao idoso, bem como uma melhora na retenção das próteses.
O que acontece com quem não tem o tipo de cuidado adequado com a saúde bucal?
O cuidado inadequado com a saúde bucal pode trazer problemas locais tais como: cáries, doenças periodontais, mau hálito, perdas dentárias, inflamações, infecções, dores e problemas decorrentes de próteses velhas e desadaptadas, como úlceras e hiperplasias. Até mesmo o câncer bucal pode estar associado a má higiene bucal e dentes em estado precário de conservação, quando acompanhado do tabagismo e/ou etilismo. Também podem ocorrer problemas sistêmicos, como um quadro de endocardite bacteriana, em casos mais graves. Não podemos esquecer que a boca é parte integrante e inseparável do restante do organismo. É pertinente lembrar que a consulta periódica ao cirurgião-dentista é de extrema importância para a promoção e manutenção da saúde bucal, em qualquer faixa etária, mas principalmente na idade avançada, onde tantas transformações acontecem.
Mirtes Helena Mangueira da Silva Dias é cirurgiã-dentista do Hospital do Servidor Público Municipal, especialista em Odontogeriatria pelo CFO, membro titulado em Gerontologia pela SBGG e mestre em Gerontologia pela PUC.
Por Fernanda Figureiredo
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