Violência contra o idoso: educar é a melhor forma de combater

Como lidar com os diferentes tipos de violência contra o idoso – essa foi a tônica da palestra da gerontóloga Marília Berzins no SESC Santo Amaro nessa quarta-feira (17). Usando exemplos reais, Marília retratou as diversas formas assumidas pela violência e deu dicas sobre quando, como e onde procurar ajuda.
A palestra faz parte da Campanha de Conscientização da Violência contra a Pessoa Idosa realizada pelo SESC-SP. Uma semana inteira dedicada ao tema tem justificativa: dados da Secretaria de Direitos Humanos mostram que entre 5 a 10% de idosos sofrem violência física. No Brasil, essas agressões correspondem a 34% das queixas dos idosos.
Marília iniciou sua palestra simulando uma queixa familiar para muitos idosos: “Puxa, depois de viver 75 anos, estou passando por isso. Tenho uma filha, cuidei dela, trabalhei e fiz muito esforço para que ela se formasse. Hoje ela mora comigo e pensa que é minha dona, sabe? Ela quer mandar em mim, nas minhas roupas, no meu corte de cabelo”.
E continuou: “E ainda pegou meu cartão do banco. No dia do meu pagamento, ela pega todo meu dinheiro e me dá só R$ 100. Mas é minha filha… Está certo, ela cuida de mim, quem paga a maioria das contas é ela. Mas a casa é minha, eu e meu marido tivemos muita dificuldade para comprá-la. Outro dia, ela me xingou de um jeito que me magoou muito. Ela falou ‘Olha, mãe, sabia que você atrapalha a minha vida? Se não fosse por você, eu estaria em outro lugar, fazendo outras coisas’.”.
Muitos participantes se reconheceram – ou reconheceram alguém conhecido – em pelo menos parte dessas reclamações.
“No grupo que coordeno, uma idosa contou que seu filho entrava no banheiro à noite, se trancava e ficava a noite inteira com o chuveiro ligado. Os pais queriam usar o banheiro e não podiam. A conta de luz era muito cara, o filho não trabalhava e era dependente deles”, relatou uma participante da ONG Amor Exigente.
Segundo a gerontóloga, muitas pessoas com mais de 60 anos convivem diariamente com diferentes tipos de violência: psicológica, porque é xingado pelos parentes; violência física, já que não raro o idoso sofre pequenas agressões; financeira, porque o filho está pegando parte do dinheiro da sua aposentadoria; e de abandono, porque o cuidador sai à noite sem hora para voltar, deixando o idoso dependente sozinho.
“Não é fácil romper a cadeia de violência. Primeiro, porque ela é doméstica e o lobo mau mora na casa do idoso, podendo ser o filho, filha, genro, nora, neto, neta, marido. Muitas vezes, o idoso nem percebe que é violência, ele acha que é normal ser mal tratado pelos filhos”, disse Marília. “E segundo, a pessoa que comete a violência pode ser dependente de álcool ou drogas e o próprio idoso se culpa por não ter sido um bom pai ou boa mãe.
Nesses casos, Marília sugere que o idoso procure a assistência social, a Defensoria Pública ou denuncie ligando para o Disque Denúncia (181) ou Disque Direitos Humanos (100). Em casos extremos, recomenda-se até que o idoso saia de perto da família.
“Muitas vezes a gente acha que a família é o melhor lugar do mundo para o idoso ficar, mas às vezes sair de perto daquela família é a solução da vida dele”, afirmou. “A gente insiste que é preciso resgatar vínculos, mas tem de onde resgatar? Às vezes, a institucionalização é a salvação da vida daquele idoso, porque ele pode recomeçar a viver.”
Embora a violência dentro de casa, com a família, seja a mais comum, ela pode acontecer também em espaços públicos: no ônibus, por exemplo, quando muitas vezes o motorista não para, ou quando outros passageiros ocupam o assento preferencial.
Para ilustrar a situação, Marília convidou membros da plateia para participar de uma esquete em que uma jovem ocupa a assento destinado a idosos dentro do ônibus. Muitos se espantaram ao perceberem que atos que consideravam normais são, na realidade, pequenos episódios de violência. Para muitos, a violência já foi incorporada ao dia a dia.
Uma das alternativas defendida por Sônia Vicentini Fernandes, gerente de uma instituição de longa permanência responsável pelo Grupo Gaia (Grupo de Assistência ao Idoso à Infância e à Adolescência), é a participação dos idosos em núcleos de convivência como uma forma de educar sobre a violência.
“Com a participação, o envolvimento e a possibilidade de diálogo, as propostas socioeducativas e culturais promovem a não-violência. Elas dão condições para que idosos que participam desses movimentos consigam enxergar essas sutilezas da violência”, disse. “Quando as pessoas começam a participar desses grupos, elas começam a se empoderar de tal forma que conseguem amenizar essas práticas.”
Por Fernanda Figueiredo